segunda-feira, 19 de julho de 2010

Pais que não podem ver filhos criam grupos de auto-ajuda

Pais que não podem ver filhos criam grupos de auto-ajuda
por LUÍS MANETA, Évora

Vítimas de alienação parental partilham experiências um pouco por todo o País.
Pais e mães obrigados a estarem afastados dos filhos durante os processos de divórcio estão a formar grupos de auto-ajuda em vários pontos do País, numa iniciativa da recém-criada Associação Portuguesa para a Igualdade Parental e Defesa dos Direitos dos Filhos (APIPDF).
"A palavra dos profissionais é boa, mas, às vezes, o mais importante é ouvirmos a experiência de outras pessoas que passaram ou que estão a passar pelo mesmo", diz Nuno V., um dos fundadores do grupo de pais de Évora que sofrem da intitulada alienação parental, que se reuniu este mês pela primeira vez.
"Não estamos aqui para dar conselhos a ninguém. Cada um compartilha a sua experiência, fala do seu caso e ajudamo-nos mutuamente. Os nossos filhos não querem um pai ou uma mãe desestabilizada. Têm direito a um bom pai e a uma boa mãe."
Pai de dois filhos menores, Nuno diz estar a passar por um divórcio litigioso do qual resultou o seu afastamento, involuntário, dos filhos. "A determinada altura, senti o tapete a sair-me debaixo dos pés, como se o mundo tivesse acabado." Durante sete meses, conta, "ter penado muito" para conseguir estar com os filhos, cuja custódia foi atribuída à mãe. Contactos pontuais e sempre sob "vigilância" de terceiros. "Vi-me no meio de uma guerra desnecessária, pois nunca quis que os meus filhos sofressem."
Embora garantindo que "sempre" conseguiu encontrar o apoio de "bons profissionais", tanto a nível psicológico como jurídico, este pai reconhece que compartilhar a sua experiência com outros pais e outras mães a viverem circunstâncias idênticas pode ajudar a "superar este grande problema".
"Apenas quero ser pai. Foi o que disse em tribunal e repito em todo o lado, quero que me deixem ser pai. O amor de pai e o de mãe são iguais."
No caso de Nuno, ser pai implicou um "grande esforço" para conhecer a lei e "persistência" para não desistir quando as portas se fechavam. Agora aproveita as reuniões de auto-ajuda para conhecer outros casos e contar a sua experiência.
"O facto de eu dizer que vou à escola visitar os meus filhos, que os pais têm direito de saber tudo sobre a educação e a saúde dos seus filhos, incentiva outras pessoas que não tiveram coragem para isso a fazer o mesmo."
"As primeiras vítimas da alienação parental são os filhos. Eles é que são as grandes vítimas", diz Alistair Grant, 50 anos, terapeuta, pai de três filhos e membro da direcção da APIPDF.
Além de Évora, a associação já impulsionou a formação de grupos de auto-ajuda em Lisboa, no Porto e em Coimbra, e criou uma linha telefónica de apoio para os pais e as mães desesperados.
"Não somos uma associação exclusivamente para homens. O nosso objectivo é a igualdade parental, numa sociedade onde culturalmente se aprende desde cedo a encarar a mãe como sendo a proprietária dos filhos."
Para a psicóloga clínica Teresa Paula Marques, a alienação parental ocorre no âmbito de um processo litigioso em que "parece valer tudo o que consiga aborrecer o(a) ex-parceiro(a)". "Neste cenário, a criança passa a ser o elo mais fraco e a arma que serve para atingir o outro." "Quando se entra no campo da patologia, surge a Síndrome de Alienação Parental, cenário no qual um progenitor engendra as mais terríveis estratégias para evitar que a criança tenha contacto com o outro e, sobretudo, nutra algum afecto positivo por ele", acrescenta a psicóloga, especialista em psicologia infantil e do adolescente.
As estratégias podem passar por gestos subtis de isolamento da criança, através, por exemplo, da vigilância das comunicações ou fazendo coincidir actividades extra-curriculares com os horários que correspondem ao outro progenitor. Mas também há casos de "purgas emocionais" - que determinam a eliminação de quaisquer recordações que invoquem momentos felizes -, distanciamento físico e até mesmo rapto.

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